Coluna Dois é Par - Lawrence Estivalet
Ed. 79 - As desculpas devidas aos LGBTs - E não as que Lula deve a Pelotas
Em artigo no Diário Popular, Jandir Barreto afirma que Lula deve desculpas a Pelotas por ter dito que somos um pólo exportador de veados. Segundo ele, informação do IBGE revela que somos a 252ª cidade escolhida por casais gays e, portanto, o ex-presidente teria nos difamado com sua afirmação. Pergunto, porém: o que há de errado em termos "veados" em Pelotas?
Não sinto vergonha que pessoas se amem aqui. Não sinto vergonha que enfrentem todo o preconceito da sociedade, da família, de si mesmas, e sejam felizes assumindo quem são. Não porque nosso ex-presidente não tenha sido preconceituoso na sua afirmação, mas porque Jandir Barreto é tão preconceituoso ou mais, ao querer que Lula peça desculpas "a Pelotas".
Quem merece desculpas, tanto de Lula quanto de Jandir, são os homossexuais. LGBTs não devem ser motivo de piada, nem de "má fama", mas de respeito, como também os heterossexuais. É contraditório que peçamos desculpas de um machismo com mais machismo. Precisamos notar que tipo de cidade e de sociedade estamos alimentando com esses discursos homofóbicos. Com certeza, não é um país tolerante, solidário, igual, nem muito menos livre.
Que as violências diminuam. Que as desculpas sejam dadas. Mas que, muito mais do que isso, que lutemos pra que elas não sejam mais necessárias.
Dúvidas, críticas ou sugestões, me enviem e-mail: lawrencestivalet@gmail.com
Lawrence Estivalet, @lestivalet
Centro Acadêmico Ferreira Vianna (@CAFV_UFPEL),
Diretório Central de Estudantes (@DCEUFPEL),
Serviço Universitário de Resistência e Justiça para Autonomia (SURJA/RENAJU),
Coordenação Nacional da Federação Nacional de Estudantes de Direito (@FENED),
Pasta de Direitos Humanos e Combate às Opressões.
Ed. 80 - Mulheres e homossexuais: Excluídas/os, violentadas/os, mortas/os
Segundo Relatório da Anistia Internacional, um terço das mulheres do mundo já foi espancada, estuprada ou submetida a algum tipo de abuso. Ao total, um bilhão de mulheres já foram violentadas - número que cresce a cada dia. Apenas no Rio de Janeiro, 10 mulheres são estupradas por dia. Com os homossexuais, não é diferente: A cada um dia e meio, um homossexual é assassinado no Brasil, mas não encaramos o problema como sério, nem refletimos sobre nossas palavras e atitudes.
Este ano se realizou, por todo o Brasil, a chamada "Marcha das Vadias". Foi uma resposta às piadas preconceituosas que reinam no nosso país, que encontraram representação na voz de Marcelo Tas, apresentador de TV, quando disse que "algumas mulheres deveriam agradecer por serem estupradas". “Homem-macho-preconceituoso” que é, tratou como piada um problema sério, que é da violência sobre o corpo das pessoas fundada em machismo.
Muito comum que se diga que homossexuais ou mulheres "exageram", que poderiam utilizar "roupas menos escandalosas", que "provocam os estupros" ou ainda que "provocam os assassinatos". Mera estupidez! Ninguém deveria olhar pra outra pessoa como “menor” por ela estar vestida ou agir de uma ou outra forma. Quem age errado é quem violenta, e não quem é violentado. Dizer o contrário é tentar disfarçar sua própria intolerância e falta de respeito com as demais pessoas.
Os números de sangue e indignidade provocados no Brasil demonstram isso claramente. É necessário que todas/os nós façamos a autocrítica, repensemos nossas piadas, nossas falas, nossas atitudes, ajudando também a educar aqueles que vivem a nossa volta. Somente assim poderemos construir uma sociedade que respeita as diferenças e contribui para a felicidade de todas/os.
Ed. 81 - Transexuais: da identidade à exploração
Escrevo hoje para que nos coloquemos no lugar das transexuais. Imagine que você tenha nascido no corpo errado. Que, sendo menino, queira ser menina; ou, sendo menina, queira ser menino. Havendo todas as ferramentas médicas disponíveis para mudar seu sexo, parece que o problema estará resolvido, certo? Errado.
Transexuais podem realizar a cirurgia de troca de sexo pelo Sistema Único de Saúde (SUS) há alguns anos. Ou seja, o Estado reconhece que é normal e necessário que a pessoa, querendo, mude de sexo. Contudo esse reconhecimento não vem acompanhado por outras políticas públicas, como de educação, emprego e saúde.
Por isso, a maioria extrema das transexuais é discriminada já na educação básica, sofrendo preconceito dos colegas e, normalmente, deixando de estudar. Sem estudo, é difícil o acesso a uma qualificação profissional mais aprofundada. Também é difícil, no mesmo sentido, que permitam que a pessoa assuma empregos como de secretária, babá, empregada doméstica, pois transexuais podem ser "perigosas" pro público em geral, atrapalhando o negócio.
Restam poucos caminhos às transexuais, exceto o da prostituição. Quando prostituídas, por outro lado, sofrem ainda mais preconceitos e explorações. Com tudo isso, o Brasil é onde mais são assassinadas transexuais no mundo. Você gostaria de passar por isso?
Ed. 82 - Diferentes corpos, diferentes vontades - Ou por que a televisão presta um desserviço à sexualidade
Nem todos nascem iguais. Algumas meninas querem ser meninas e gostam de meninos, outras querem ser meninas mas gostam de meninas, outras ainda querem ser meninos, gostando de meninos, e há ainda as que querem ser meninos, mas gostam de meninas. Sem falar nas que gostam de ambos. Parece confuso, e é, mas precisamos entender essas diferenças, para que possamos desfazer alguns mitos que a mídia e o senso comum nos fazem engolir.
Enumero três conceitos importantes: (1) sexo, (2) identidade de gênero e (3) sexualidade. SEXO é uma categoria estritamente biológica e, portanto, não precisa de maiores explicações: ou se nasce do sexo masculino (homem) ou do sexo feminino (mulher).
IDENTIDADE DE GÊNERO, diferentemente, tem a ver com o sexo que a pessoa se identifica: a pessoa pode se identificar com o gênero masculino ou feminino, querendo ser mais ou menos masculino/feminino, independentemente de ter nascido ou não neste sexo.
SEXUALIDADE, por fim, diz respeito a gostar de alguém do mesmo sexo, do outro ou de ambos (homossexual, heterossexual ou bissexual).
É interessante observar, contudo, que não existe conexão direta entre identidade de gênero e sexualidade. Pode-se possuir uma identidade de gênero que não corresponda ao sexo (nascer homem e se identificar como mulher ou o contrário) e uma sexualidade que se mantenha dentro dos padrões de normalidade da nossa sociedade (heterossexual, portanto).
Da mesma forma, pode-se ser homossexual (gostar de pessoa do mesmo sexo) e ter identidade de gênero correspondente ao sexo, isto é, ser homem e gostar de ter traços masculinos ou ser mulher e gostar de ter traços femininos.
Não é inferior ou superior a/o homossexual que possui identidade de gênero mais ou menos parecida com seu sexo. Sente-se bem assim, tão-somente, e assim deve ser respeitada/o.
Nao é diferente com heterossexuais ou com bissexuais, embora a televisão insista em nos problematizar a identidade de gênero apenas dos homossexuais, e normalmente de forma caricata, estigmatizada, alimentando preconceitos.